O ansioso movimento da mídia jornalística em torno dos temas “investimento na crise” ou “onde investir” denuncia nossa imaturidade para lidar com crises econômicas. Isso seria um absurdo no Brasil, berço de dezenas de crises nas últimas décadas, não fosse nossa também imatura – para muitos, inexistente – educação financeira. Por mais que estejamos vivendo um momento único em termos de gravidade da crise, não nos faltaram experiências para nos avisar de que crises vêm e vão, de tempos em tempos, e que, por isso, temos que nos preparar para elas.
A preparação não consiste simplesmente em manter reservas financeiras. A qualidade de nossa poupança, seu equilíbrio com um consumo de qualidade e a consciência das pessoas em relação ao que deve ser feito em tempos de escassez são primordiais para que atravessemos as nuvens negras com um sentimento de segurança. A regra é simples: nas crises econômicas, há pouco a ser feito para amenizar situações graves como a perda do emprego, a perda de rentabilidade de um investimento ou o enfraquecimento de um negócio próprio. Se há algo a ser feito, é no sentido preventivo, antes da bomba estourar.
O equilíbrio no consumo é conquistado com uma estrutura de vida mais simples. Você pode gastar a quase totalidade de sua renda sempre, mas a forma como gasta faz muita diferença. Se seus gastos se concentram apenas em compromissos fixos considerados relevantes, como moradia, financiamento do automóvel, planos de saúde, escola e alimentação, a perda total ou parcial da renda irá inviabilizar as condições mínimas de dignidade e sobrevivência de sua família. O desemprego de um dos membros da família inevitavelmente resultará no caos e em atitudes nada racionais durante a busca por recolocação.
Se por outro lado, sua opção fosse por viver com custos fixos menores, incluindo uma moradia mais simples, um automóvel menor e um padrão de moda um pouquinho inferior ao que seus pares usam, estaria criada a situação que chamo de estrutura de vida mais simples. O menor conforto nos itens considerados de sobrevivência poderia ser compensado com maior disponibilidade de verba para a qualidade de vida, incluindo sua diversão, cuidados com o corpo, educação complementar e cultivo de pequenas manias. Diante de uma crise, tais itens podem ser mais facilmente administrados, pois não precisam ser caracterizados como custos fixos e podem aguardar um período de reestabilização do orçamento da família para voltarem a ser consumidos.
Nos investimentos, a situação é semelhante. Nas crises, você deve ter de onde tirar recursos, seja para manter uma família sem emprego, seja para viabilizar um plano B. Evite assumir grandes compromissos com suas especulações. Cultive uma carteira de investimentos que privilegie sempre (mesmo nas crises) a segurança e previsibilidade, deixando uma parcela reduzida de seus investimentos para ser multiplicada com alternativas de risco significativo.
Quem não se preparou para esta crise, seja por estar com um orçamento estrangulado por grandes compromissos, seja por estar com sonhos estrangulados por perdas significativas nos investimentos, não tem alternativa a reconhecer o erro, assumir mudanças drásticas em sua estratégia e construir uma base sólida para a próxima crise que, quando menos esperarmos, chegará às nossas contas. Sim, reduzir o padrão da moradia, para diminuir custos e criar um fôlego financeiro, é uma boa escolha. Redesenhar sua carteira de investimentos para ter uma participação reduzida em alternativas de risco é outra atitude sábia.
Perceba que não falo de fugir do risco, mas sim em contar com parcelas reduzidas dele, para colhermos, no longo prazo, diferenciais dos ganhos entre cada crise. Se a crise forçou a composição de sua carteira a uma predominância da cada vez menos rentável renda fixa, não faça nada com o dinheiro que você já tem. Apenas cuide de manter essa distribuição nos aportes futuros, preservando uma carteira que sempre lhe trará segurança, e também liquidez diante de oportunidades certas. Com tanta perda vista nessa crise, certamente na próxima teremos mais lições a colocar em prática e menos a reclamar.